20 de novembro de 2007

O ano já se aproximando do fim, lojas e fachadas travestidas de natal, pessoas em momentos agitados pré-compras, pré-férias, pré-festas, pré-fim de ano, e eu sem ver motivo para qualquer dessas coisas. Natal é ou já foi algo com um certo charme, ainda que não veja muito sentido religioso no meio de tanta euforía capitalista, mas ainda assim, eu espero por tempos melhores a cada ano que chega. É esse o sentimento que (ainda) o fim de ano me passa.
As pessoas estão cada vez mais sólidas, mais frias. Chega a doer ver o quanto cada um que nos cerca é menos caloroso, menos emotivo, apenas por não terem, talvez, conhecido algo melhor. O tempo passa, é cruel; e eu já disse uma vez, aqui mesmo, que o tempo é um predador sem dentes. Foi uma das melhores filosofias de vida que já me foram passadas. Nem lembro onde li isso, mas é muito sábio.
Pelo menos, nem tudo é triste. Temos um ano de Pan em que tudo deu certo - no Pan - apesar de tudo ter voltado ao normal(?) depois e com um direito à um bônus(?) de CPMF´s aprovadas, impunidade (já manjadíssima) no senado, policiais sendo mortos e neguinho da ONU vir encher o saco com aquele lamentável e dispensável papo de 'direitos humanos'; e ainda assim podemos sorrir com coisas legais na música, na cultura, no futebol (Copa 2014, será?), sempre os famigerados motivos que temos para ter orgulho, ainda que um pouquinho apenas, desse país que vivemos.
Para coroar a idéia que tive ao escrever esse post, coloco aqui uma música do Zé Ramalho que pode abençoar um pouco o meu texto. Quem não conhece, vale muito a pena dar uma lida nessa letra.

O Meu País
Zé Ramalho
Composição: Livardo Alves - Orlando Tejo - Gilvan Chaves


Tô vendo tudo, tô vendo tudo
Mas, bico calado, faz de conta que sou mudo

Um país que crianças elimina
Que não ouve o clamor dos esquecidos
Onde nunca os humildes são ouvidos
E uma elite sem deus é quem domina
Que permite um estupro em cada esquina
E a certeza da dúvida infeliz
Onde quem tem razão baixa a cerviz
E massacram - se o negro e a mulher
Pode ser o país de quem quiser
Mas não é, com certeza, o meu país

Um país onde as leis são descartáveis
Por ausência de códigos corretos
Com quarenta milhões de analfabetos
E maior multidão de miseráveis
Um país onde os homens confiáveis
Não têm voz, não têm vez, nem diretriz
Mas corruptos têm voz e vez e bis
E o respaldo de estímulo incomum
Pode ser o país de qualquer um
Mas não é com certeza o meu país

Um país que perdeu a identidade
Sepultou o idioma português
Aprendeu a falar pornofonês
Aderindo à global vulgaridade
Um país que não tem capacidade
De saber o que pensa e o que diz
Que não pode esconder a cicatriz
De um povo de bem que vive mal
Pode ser o país do carnaval
Mas não é com certeza o meu país

Um país que seus índios discrimina
E as ciências e as artes não respeita
Um país que ainda morre de maleita
Por atraso geral da medicina
Um país onde escola não ensina
E hospital não dispõe de raio - x
Onde a gente dos morros é feliz
Se tem água de chuva e luz do sol
Pode ser o país do futebol
Mas não é com certeza o meu país

Tô vendo tudo, tô vendo tudo
Mas, bico calado, faz de conta que sou mudo

Um país que é doente e não se cura
Quer ficar sempre no terceiro mundo
Que do poço fatal chegou ao fundo
Sem saber emergir da noite escura
Um país que engoliu a compostura
Atendendo a políticos sutis
Que dividem o brasil em mil brasis
Pra melhor assaltar de ponta a ponta
Pode ser o país do faz-de-conta
Mas não é com certeza o meu país

Tô vendo tudo, tô vendo tudo
Mas, bico calado, faz de conta que sou mudo.